terça-feira, 13 de julho de 2010

Vícios inconfessáveis...

A Maria diz que agora está na moda termos vícios inconfessáveis. Como estamos a tomar o pequeno-almoço numa esplanada pública olho para o lado para verificar cuidadosamente quem nos possa ouvir e delatar. Ela continua nesta incursão pelas falácias da vida (e da Haute-Couture em Paris) e diz que vai viciar-se em qualquer coisa. Como nunca esperei ouvir estas palavras começo a antecipar o pior. Ela diz, tranquilamente, que eu não tenho nada com que me preocupar. O vício dela vai sair barato e é chique. Diz que se vai viciar em Ferrero Rocher e que vai ser a desculpa perfeita para o marido pagar a todos uma semana na Betty Ford na Califórnia.

Eu fico branco como a cal quando ela olha para mim e me pergunta qual vai ser o meu vício inconfessável. Em alguns segundos vem-me tudo à cabeça. Sapatos da Berluti, carteiras de fundos de investimento do Citigroup, acções da Nestlé, livros sobre cozinha molecular, fotografias eróticas de estrelas de telenovelas mexicanas. Depois, com ar decidido, digo-lhe com alguma rancor que estou magoado por ela nunca se ter apercebido do meu vício já antigo.

"Revistas?", diz ela. "Mas quem é que se vicia em revistas?". E assim trama-me mais uma vez. É verdade que nem eu sei de onde é que saiu esta necessidade de fazer montinhos de revistas (estrangeiras, caras e muitas vezes repetidas, por sinal) por toda a casa em pilhas de Design de Interiores. Acho que desde pequeno me decidi a coleccionar informação e o vício foi crescendo. Já não bastava não ter sítio para colocar tanto papel como agora vem a Maria e diz que o meu vício está desactualizado.

Ainda penso em dizer que também sou viciado em Chocapic desde criança mas acabo por dar-me como derrotado.

A Maria tem uma força interior impossível de combater e está obstinada. Quer convencer-me que eu estou passado da actualidade e que me devo curar com um novo vício.

Digo-lhe que vou pensar no assunto enquanto termino a minha meia de leite já fria.

E "ódios de estimação?" pergunto eu. "Tens algum inconfessável?".

Ela diz que não, que se deixou disso quando foi à bruxa e tomou um banho de sal grosso. Eu acho estranho e desconfio. Afinal todos nós temos ódios de estimação. Ela acha estranha a minha insistência e diz que se libertou das energias negativas e não consegue não gostar de ninguém. Eu, pelo contrário, já estive mais longe desta afirmação. E então disparo com os meus ódios pessoais. Digo-lhe que odeio quando me entornam o café com leite na chávena, quando vou na rua e encontro alguém que anda aos círculos e muito, muito lento, quando apanho alguém num posto de informação da Carris ou da Segurança Social que decide perguntar onde é que se pode encontrar um ensaio sobre a Susan Sontag em japonês, quando descubro que existem pessoas que não gostam do Nanni Moretti e embirram com os livros da Chelsea Handler. E digo-lhe que odeio pessoas pseudo-frontais. Aquelas que dizem tudo com "total" sinceridade e dizem que não conseguem dissimular ou mentir. E não conseguem "conter-se". E dizem tudo "na cara". Yeah, right....

Ah, e odeio pessoas que adoram iogurtes. Não sei porquê mas desconfio de toda a gente que se delicia com iogurtes e mais ainda todos aqueles que fazem disso o almoço ou jantar. A Maria diz que é por isso que nunca vou trabalhar na Danone. Eu acho que é porque nunca mandei a minha fotografia actual e de perfil no Curriculum Vitae...

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