A minha amiga Maria diz que a vida não está fácil. E que o mundo está de pernas para o ar.
A Maria tem destas coisas, diz tudo o que lhe vem à cabeça em jeito de profecia ou ensaio filosófico e deixa-nos a todos a pensar seriamente no assunto.
Não por muito tempo que a vida não está fácil e o tempo é dinheiro que se pode gastar no Starbucks em créditos futuros. Como a Bolsa e os Fundos de Investimento na Bolívia e Argentina parece que não dão nada (só dores de cabeça) mais vale investir em cafeína internacional e de origem controlada.
Eu cá penso que esta nova incursão da Maria se deve à paixão actual e desmedida por aulas de Yoga num centro pouco apto para suores frios no Monte Estoril com um antigo e auto-intitulado guru da Oprah, e por ter feito muitos pinos quando era criança nas aulas de ginástica das Doroteias antes de ser expulsa por se recusar a comer o puré de batata três vezes seguidas. E os croquetes congelados....e os pêssegos em calda já moles e sem graça...
A Maria acha que o mundo está sempre ao contrário, já nos habituámos ao género e vocabulário. É raro darmos importância ao assunto, a não ser que os pinos habituais acabem por fazer sentido. O Zé ficou a pensar nisto demasiado tempo, o que também é estranho e raro num homem de negócios sábio e bem sucedido (terceiro casamento, duas crianças adoráveis nos Maristas e dois carros na oficina por arranjar com umas pancadinhas sem importância). Acho que foi inveja pelo gigantismo do BMW descapotável.
Este é um trio interessante e sabido da vida.
A Maria deu para "Tia" há alguns anos com um casamento de conveniência planeado ao milímetro como o bordado do vestido comprado na Colette em Paris. Passa o dia em caçadas no Alentejo ou em festas de solidariedade com adolescentes problemáticos do Benim. Quando não tem horas ou obrigações a cumprir lá vai dando para almoçarmos e trocarmos umas ideias sobre o assunto. É a parte mais engraçada do meu dia e acabamos sempre no mesmo sítio e com a mesma despedida: "tanto por dizer e tão pouco tempo". Enfim, a Maria corre pela vida como uma lebre de classe enquanto eu vou a passo de tartaruga premiada num festival de circo. Dá para imaginar o tom da conversa semanal. Os empregados de qualquer restaurante ou pastelaria já nos conhecem e tratam-nos como uma família estranha mas abastada. Deve ser pelas gorjetas da Maria que a vida está pela hora da morte e por mim nem um Euro deixava (dá para o bilhete de Metro no regresso).
A outra presença nos almoços da "conversa (a)fiada" chega sempre atrasado e nunca paga a conta.
Ou se esquece da carteira Zegna, ou o sapato Prada está apertado (nunca percebi a relação com a factura em cima da mesa), ou um dos filhos liga a dizer / gritar / chorar que comeu um Gormiti (quando é que os bonecos passaram a ter este nome?) com pastilha elástica da Gorila.
Pobre Zé Eduardo, tão promissor que ele era...
O Zé acabou por subir na vida sem grande esforço e muitas horas ao computador a inventar "gadgets" impronunciáveis nas feiras de tecnologia de Seoul (ou será Nagoya?), e eu continuo sentado à espera que um milagre aconteça.
Seguramente não vai acontecer porque não só não acredito em milagres como nunca tive boa postura nem em cadeiras nem em sofás (vida de marreco a olhar para o boneco como diz a minha avó).
Eu acho que é a vida, como diz a Maria, hoje de pernas para o ar, amanhã com um perneta, amanhã de perna ao léu...
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